Lá, o tempo era o que não nos faltava. A gente acordava tarde, e ainda assim, vivia, vivia e vivia: o cheiro do café, o frio do vento,
a água quentinha da banheira; o acordar com o barulhinho das crianças brincando
na sala, o caminhar longo e lindo de todos os dias. Quer vida mais viva que
essa? Não pode ter sido só dez dias.
Porque juro, eu encontrei uma irmã linda e
feliz, que arrumava a cama, a mesa e o banho; vi meus sobrinhos loirinhos e
europeus, conversando com o moço espanhol do restaurante assim como conversavam
com o porteiro da escola daqui. Meu cunhado nos regando de alegrias e vinho dos
bons. Eu saboreei cada delícia que minha mãe preparou, coisas que não imaginei
em quase 39 anos de vida. Eu reencontrei uma amiga que nunca saiu do meu lado,
e limpamos a casa, fizemos compras e rimos, rimos e rimos! E a conversa era
longa e adentrava na noite. E falamos sobre uma vida inteira.
Eu vivi conviver com crianças todos os dias, ir àquitanda e ao supermercado a pé, tomar
conta de tudo e me deixar levar pelas ruas ao mesmo tempo. Eu saí sem medo e
era quase meia-noite. E a minha sobrinha de 10 anos buscou sozinha uma comidinha
na delicatessen do quarteirão ao lado, também destemida.
Eu vivi as crianças brincando em castelos, e o vento frio no rosto, e saí de novo pra comprar vinho numa noite de chuva, a pé e sem medo. Eu agradeci a Deus por estar no alto da montanha, por ter chegado lá “frutuantemente frutuante”, como disse a Maria, por ser acolhida na casa da minha família lá. Eu vi meu filho ganhar um autógrafo de um grande jogador de futebol e me olhar com olhos agradecidos.
Eu vivi as crianças brincando em castelos, e o vento frio no rosto, e saí de novo pra comprar vinho numa noite de chuva, a pé e sem medo. Eu agradeci a Deus por estar no alto da montanha, por ter chegado lá “frutuantemente frutuante”, como disse a Maria, por ser acolhida na casa da minha família lá. Eu vi meu filho ganhar um autógrafo de um grande jogador de futebol e me olhar com olhos agradecidos.
Eu desencanei do turismo e viajei. Os meus filhos gostaram
mais do parquinho público ao lado da casa da tia do que do Parque Guel. E um
Gaudi foi surgindo no coração deles porque curtiram a cidade e não a obra. Por isso, vivemos em Barcelona. Por dez dias, um novo estilo de vida que não se encontra fácil por aqui.
Mas, aqui é bom e quentinho, tem nossa casa, o trabalho e a escola. E tem o Fe. E voltar faz parte desse poder ir e vir que é o melhor continente do mundo.
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